domingo, fevereiro 05, 2006

Acordou de sopetão, com uma sensação estranha que lhe subia a garganta desde o estômago, como se tivesse engolido algum tipo de bicho que não havia ainda desistido da vida. Olhou pela janela, e após ser ofuscado pelo reflexo da copa das árvores misturado ao espelhamento do prédio branco do outro lado da rua, seus olhos se acostumaram e viu que a janela estava aberta - "É bem possível que seja isso mesmo", riu-se.

Ao iniciar seu ritual matutino percebeu que o sol não estava somente luminoso, mas havia aquecido o ar, que estranhamente não o sufocava. Não sentia fome. Bebeu um copo d'água estupidamente gelada e sentiu o líquido descer por suas entranhas, gelando-lhe todo físico. Alguma boa alma havia colocado sonatas de Mozart no som e ele podia ouvir perfeitamente.

Maravilhado pelo presente, deitou-se no divã da sala e deixou-se prostado numa posição que tanto tinha de aleatória quanto de naturalmente sensual. Sensual: era essa a palavra. Todos os seus sentidos então se aguçaram quando percebeu que o calor e ar úmido haviam extraído da terra e das plantas aromas análogos aos incensos mais deliciosos que havia provado no passado. Abriu os olhos e olhou nuvens brancas que rolavam com mais intensidade no céu de tons variados de azul. Deitou o livro que vinha lhe causando tanta fascinação estes dias ao seu lado e entrou num estado de semi-consciência. Neste momento o solo de barítono da nona sinfônia de Beethoven começava, anunciando a Ode à alegria. Amava sua terra e sabia disso. Encontrara a liberdade em meio às privações, finalmente.

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